segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Chuva

CLÁUDIA Toque toque.
PEDRO Eu conheço-te de algum lado?
CLÁUDIA Tristão. Não. João. Não. Armanda.
PEDRO Armanda.
CLÁUDIA Que buraco é este com a tinta a cair da parede onde eu vim parar?
PEDRO É o que há.
CLÁUDIA E o que é que se faz aqui?
PEDRO Procura-se o modo de salvar o mundo, Armanda. É o refúgio da inteliguentsia.
CLÁUDIA E quem é essa gente?
PEDRO Sou eu.
CLÁUDIA E o que é que tu fazes? Escreves cartas? Vês filmes? Fazes o almoço?
PEDRO Estudo os ventos. L’air du temps. E procuro aliados. Eu e ela (aponta para Patrícia).
PATRÍCIA (para Cláudia) Quem és tu?
CLÁUDIA Tristão. Não. João. Não. Rogério.
PATRÍCIA Rogério. Podemos confiar em ti, Rogério? O assunto é sério, Rogério. O perigo eminente. Nunca estivemos tão perto do fim. Os monstros aproximam-se. A devastação cada vez mais perto. Os órgãos de estado ignoram-nos, a polícia secreta não nos atende, o primeiro-ministro não reponde aos mails, a imprensa despacha-nos. Faltam-nos meios mas temos a sabedoria e a criatividade. Somos nós contra todos. E precisamos de aliados.
CLÁUDIA Eu tenho uma família. Responsabilidades. Estou em viagem. Não posso abandoná-los. E não acredito em ti. Nem em ninguém. Nem em nada.
PATRÍCIA Então vai-te molhar.

E chove outra vez.