quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Badiou cont. (ou a Novela da Jardim)

"10. A dificuldade geral do teatro, em todas as épocas, é a sua relação com o Estado. Porque ele lhe é sempre adossado. Qual é a forma moderna dessa dependência? Ela é delicada de regular. É necessário subtrair-se a uma visão de tipo reivindicativo, que faria do teatro uma profissão assalariada como as outras, um sector lamentador da opinião pública, um «funcionariado» cultural. Mas é igualmente necessário subtrair-se da acção única do príncipe que instala no teatro lobbies cortesãos, servis face às flutuações da política. Para tal é necessária uma ideia geral que, na maior parte dos casos, utiliza os equívocos e as divisões do Estado (assim, um comediante-cortesão como Molière, pode virar o jogo contra o público nobre ou snobe ou devoto, com a cumplicidade dum rei que tem as suas próprias contas a ajustar com a sua envolvente feudal e clerical; e Vitez, o comunista, pode ser nomeado para Chaillot por Michel Guy porque a envergadura ministerial do homem de gosto agrada à «modernidade» de Giscard d'Estaing, etc.). É certo que se impõe, para conservar junto do Estado a necessidade do surgimento das ideias-teatro, uma ideia (a descentralização, o teatro popular, «elitista para todos», e assim sucessivamente). Esta ideia é, por agora, demasiado imprecisa, donde a nossa morosidade. O teatro deve pensar a sua própria ideia. Só pode guiar-nos a convicção de que hoje, mais do que nunca, o teatro, porquanto pensa, não é um dado da cultura, mas da arte. O público não vai ao teatro para aí se cultivar. Ele não é um amado ou amimado. O teatro revela da acção restrita e toda a confrontação com a Audiência, ser-lhe-á fatal. O público vem ao teatro para ser abanado. Abanado pelas ideias-teatro. Ele não sai do teatro cultivado mas aturdido, cansado (pensar cansa) preocupado. Ele não encontrou, mesmo no maior dos risos, com que se satisfazer. Ele encontrou ideias que não supunha existirem."