"Julgo que ainda está muito presente uma concepção romântica do amor que, de certa maneira o consome no encontro. Ou seja, o amor queima-se, consome-se e é consumado a um mesmo tempo, no encontro, num momento de uma mágica exterioridade relativamente ao mundo. Qualquer coisa acontece da ordem do milagre, uma intensidade de existência, um encontro de fusão. Só que quando as coisas acontecem deste modo não estamos na presença da “cena do Dois” mas sim na “cena do Um”. Na concepção de fusão do amor os dois amantes encontraram-se e aconteceu uma espécie de heroísmo do Um que se opõe ao mundo. Muitas das vezes, na mitologia romântica, esta fusão conduz à morte. Há uma ligação íntima e profunda entre o amor e a morte, cujo ponto alto é sem dúvida o Tristão e Isolda de Richard Wagner, porque consumimos o amor no momento inefável e excepcional do encontro e depois disso não podemos mais voltar a entrar no mundo que se mantém exterior à relação.
Trata-se de uma concepção romântica radical, e julgo que ela deve ser recusada. É de uma beleza artística extraordinária mas, do meu ponto de vista, tem um inconveniente existencial grave. Convém mantê-la como um mito artístico poderoso mas não como um verdadeira filosofia do amor. Porque o amor, apesar de tudo, tem lugar neste mundo. É verdade que se trata de um acontecimento que não foi previsto ou calculado segundo as leis do mundo. Ninguém pode inventar o encontro porque ao fim e ao cabo quando nos vemos, vemo-nos e isso é irredutível! Mas o amor não se pode reduzir ao encontro, porque também é uma construção. O enigma do pensamento do amor é completado pela questão dessa durabilidade. No fundo, o ponto mais interessante não é a questão do êxtase dos começos. É claro que há um êxtase dos começos, mas um amor é acima de tudo uma construção duradoura. Digamos que o amor é uma aventura obstinada. O lado aventureiro é necessário mas a obstinação também. (…) Um amor verdadeiro é aquele que triunfa na duração, muitas vezes duramente, perante os obstáculos que o espaço, o mundo e o tempo lhe propõem."
Alain Badiou, Éloge de l'amour