BERLIM DIÁRIO (fechas fronteiras) 16
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Estou em contagem decrescente. Conto as horas para trás. Acordo à meia noite e deito-me às sete da manhã. Corro de costas. Afasto-me e não me aproximo. Cada vez mais novo, repito vezes sem conta: regresso. A tempestade está no princípio. À minha frente.
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Hoje, na despedida de uma terapia de grupo académica, a regente pronunciou-se: Este encontro foi tremendamente produtivo. E eu por dentro pensei: produtivo, produção, produto. Produto, produção, produtivo. E não fui capaz de abandonar esta tríade. Bloqueei. O que faço eu com ela? Como saio do círculo? Olhei para as minhas mãos vazias. Olhei para a cidade nas minhas costas. Uma memória a fugir. Um diário, arquivo inconsequente. Recuei pelos dias. Tropecei nos livros no tapete de casa. O tampo da secretária está vazio. Tenho a mala aberta no chão a aprontar-se para a partida. Esvaziei o frigorífico. Produtivo, produção, produto. Tenho de me justificar assim? A minha existência? (Uma música no ipod ao sair do metro: I was here, I lived, I loved, I was here, etc. - assustei-me.) Produto, produção, produtivo. Justificação para me achar. Para topar o meu cheiro. O lastro. Para definir os metros quadrados que ocupo. O meu registo. Como se eu existisse. Como se o produto fosse eu. Para ser produtivo. Mas que produto sou eu? (E não, isto não é sobre a ditadura económica contemporânea, não me estou a queixar do mercado ou do capitalismo, etc.) Que existência é esta que recua à procura de um mindinho, ou seja, à procura de uma coisa pequena capaz de servir de início para tudo o que aí vem? Quem é este diário escrito ao contrário? Onde é que ele está? Nunca mais começa a história.
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