terça-feira, 6 de novembro de 2012

BERLIM DIÁRIO (fechar fronteiras) 5


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Berlim contribui para a nostalgia. 
O teatro que não mudou, mudaram apenas as pessoas nos escritórios. Oferecem-me cervejas. E bilhetes. Fui ver Disabled Theatre. E durante pensei: Disabled Theatre também sou eu. Porque me leem sempre como capaz? Eu sou incapaz!(Tempestade) 

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Hoje tentarei ser mais claro. Acordei de manhã com essa vontade. Olhei para o dia anterior e pensei: Não posso continuar assim. Estou a expulsar os leitores da minha vida. Não posso caminhar para a solidão. E resolvo abrir o livro das histórias. Tenho umas quantas reservadas para momentos de crise. Leio-as. Em voz alta, para mim. E assim que fecho o livro resolvo sair de casa. Desta vez não vou correr para o parque onde há camelos em jaulas e esquilos à solta. Desta vez não vou ao supermercado comprar água e cerveja e sumo e iogurte. Nem sequer vou ao cinema. Desta vez não vou para a rua com os ouvidos tapados com música e os olhos enfiados nas frases. Não! Não vou fazer de toupeira. Olho em volta. Estou entusiasmado. Cada página que leio agora é transparente e deixa ver por trás o movimento do mundo. Oiço as vozes a gritar. Respondo de volta. Escrevo em letras grandes: Apaguem as velas! (esta mania das velas nos bares de Berlim). Bebi cinco cervejas mas continuo sóbrio que nem uma árvore. Já é noite e ainda é tão cedo. Vamos continuar a história. Próxima estação? Entro numa galeria. Está vazia. Anuncio: “Abri-me para o povo. Estou disponível para comunicar. Quem é que quer primeiro?” Fica tudo a olhar para mim. Tudo é quatro paredes, uma delas só vidro, estilo montra. Nada que me atrapalhe. É domingo. Temos todos tempo. Passo do lado de fora dos cafés com velas. Na mão tenho uma garrafa. Não sei onde a encontrei. Será que a história já acabou? Entro no metro com esta pergunta. Não me lembro do fim da história. E se pensar bem, também não sei do princípio. E agora? Em que estação devo sair? Onde é que moro?

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