quinta-feira, 1 de novembro de 2012

BERLIM DIÁRIO (fechar fronteiras) 0

(Vou passar as próximas três semanas em Berlim, no departamento InterArts da Freie Universität, a cumprir parte do meu programa de doutoramento. Entretanto, escrevo aqui.)

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Este é um diário que não se faz de dias mas de letras. Ocupo uma cidade que não é minha mas já foi e olho para as ruas que passam no meio dos livros. Estou aqui em missão. Cada frase é uma parte cumprida. Peço condescendência ao leitor. Não prometo nada. Podia começar como acabarei: com um epílogo. E nesse final vou dizer: tirem-me daqui. Até lá, vou tentar divertir-me, ou seja, vou escrever uma comédia, ou seja. vou tentar confundir, ou seja, vou tentar não ceder, ou seja, vou inventar um mundo provisório, ou seja, incompleto, ou seja, o que quer que isso seja.
Este diário é um diário sem utilidade. Também não faz turismo. Nem dá visibilidade. Mas tem objetivos. É uma coisa concreta com frases ambiciosas. A sua ambição é encontrar o caminho da concretização. O diário acompanha todas as outras escritas, todas as outras frases, as que escrevo noutras páginas e as que não escrevo. E se estas são as primeiras frases a aparecerem aqui é apenas porque são as primeiras frases a aparecerem aqui. Pensei noutras antes destas. Ainda as oiço ao fundo. Ficaram no avião. Ficaram nas escadas que subi. Nos autocarros. E levaram-me até ao terceiro andar onde agora sinto os pés frios. E cada uma dessas frases foi uma tentativa. Quando aqui chego, passei por muitas. Concretizei algumas. Escrevi uma tempestade, comecei uma apresentação, estive numa reunião, fui a uma estreia, escrevi uma carta, andei debaixo de chuva ou fui correr para o parque. 
Para terminar este epílogo, uma última informação: eu não existo. Estou aqui como estou ali. 

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