“Every damned thing is your own fault if you’re any good.”
Hemingway, Green Hills of Africa
“Every damned thing is your own fault if you’re any good.”
Hemingway, Green Hills of Africa
C: Onde é que foi que estávamos enfiados em lama até ao pescoço?
S: Irão.
C: E tu a espirrar sangue por todo o lado e eu também e a dizer para mim: não quero morrer sozinho. Não quero morrer sozinho, cheio de buracos e de lama. Quero morrer com uma coisa que valha a pena, Bruce. Quero morrer com uma mulher. Quero morrer com alguém que goste de mim. Não quero morrer por um homem, quero morrer ao lado de um homem. De um amor.
S: Estou preocupada com a minha reforma. Achas que ainda vai haver dinheiro no final do ano? Estou cada vez mais velho. O que é que eu vou comer?
B: Vamos tratar de negócios. Quem é que quer trabalhar?
S: Eu estou reformado. Mas faço um trabalhinho. O último trabalho.
C: Queres ser a minha mulher? Vamos reformar-nos juntos. Vamos viver para a Florida.
B: Não. Vamos fazer uma comédia de guerra. Arnold, estava à tua espera.
A: De mim?
B: (aponta para S) Não, dela.
S: Eu não sou o Arnold.
B: Então sou eu! Mas se sou eu, não posso estar à espera de mim. Não faz sentido. Gramaticalmente. Na frase. Na vida. Sou uma pessoa sem sentido. Nem personagem nem pessoa. Que medo! Quem é que eu sou? Isto não é suposto ser uma comédia? Então porque é que eu não me estou a rir?
C: Não é por tu não te estares a rir que isto não é uma comédia. Pode ser uma má comédia. Mesmo que ninguém se ria, mesmo que ninguém se tenha rido uma única vez, continuas sem poder dizer que isto não é uma comédia. Não só porque nada te garante que no futuro alguém não se venha a rir como também, e como consequência, não podes definir a comédia pela sua capacidade de fazer rir. É um equívoco. És um equívoco. E é por isso que tens de te rir. É por isto ser uma comédia que tu tens de te rir. É a comédia que te valida a ti e não tu que validas a comédia. Ri-te! Tens de te rir. É a comédia que diz.
A: Mas não tenho vontade de rir.
B: Arranja, Jolie.
A: Mas eu já não sou a Angelina Jolie.
B: Angelina Bastos? Lopes?
C: Reformei-me. Há anos que não mato pessoas. Há coisas que não se esquecem. Palestina, Cazaquistão, Angola, Senegal, Síria. Sangue. Braços soltos. Olhos perdidos. Dedos dos pés. Estou a ter um déjà voodoo. Porque é que os velhos têm de recordar. Permanentemente. Não quero. Quero pensar o futuro. Quero morrer com uma coisa que valha a pena, Bruce. Quero morrer com um homem. Quero morrer com alguém que goste de mim. Não quero morrer por uma mulher, quero morrer ao lado de uma mulher, é isso que quero. Ser jovem.
B: Queremos todos. Mas temos de voltar à comédia que não existe. Não nos podemos desviar do nosso caminho que não existe. O tempo passa. O General Garza é um homem complexo. E bem armado. Não vai ser fácil entrar na fortaleza. Vamos precisar de um avião, muito poder de fogo e… alguma sorte. Partimos daqui a duas horas. Já partimos.
S: O meu nome é General Garza e vocês não podem estar aqui.
C: Calma, se começas logo a ficar furiosa no princípio da cena, como é que vais acabar?
S: Não posso dizer o que me vem à cabeça? Quem é que escreveu isto? Quem é que escreveu “Não posso dizer o que me vem à cabeça?” Mas quem é que ainda se dá ao trabalho de emancipar o actor? O actor não tem de se emancipar. Tem de deixar de existir. Com eu e tu e este texto. Porque é que eu não me estou a rir? Só me apetece berrar! O meu nome é General Garza. Sejam bem-vindos à nossa ilha. Este bigode deixei-o crescer para o filme. Sou um actor do método e nunca seria capaz de representar um General sul-americano se não tivesse um bigode. Quando representei um soldado afro-americano na guerra do Iraque, fiz uma plástica para mudar a cor da pele.
C: E qual é o teu próximo projecto?
S: O meu próximo projecto é lutar por uma reforma condigna. E morrer antes que acabe o pilim.
C: Já ninguém diz pilim.
S: Lagarto, lagarto, lagarto. Fiz uma implantação de cabelo grisalho e escavei as rugas na cara com a ajuda de um bisturi.
C: Mas não és um soldado sul-americano?
S: Sou um actor do método. Já não sei quem sou. Isto de mudar tantas vezes de personagem confunde-me o BI. O que é que eu disse?
B: Mickey, estás cada vez mais lindo. A idade dá-te vida. Há quantos anos é que não nos víamos?
S: Desde a Argélia.
B: Foi assim há tanto tempo?
S: Dormimos na mesma tenda.
B: Foi.
S: Não vais dizer mais nada?
B: Preferia não. As memórias merecem o silêncio.
S: Consegues sempre dizer qualquer coisa que me desarma. Vamos para a cama. Reviver. Amo-te. Odeio-te. Adoro-te. Detesto-te. És lindo. Horrível. Não consigo decidir. Desarmas-me.
B: Mickey. Tem calma. Já não temos idade para isto. Desde que cheguei à idade da reforma que prefiro aproveitar o que é bom e evitar o que é mau. A idade é só vantagens. Mas quem é que escreveu isto? Eu não falo assim.
Let's dance in style, let's dance for a while
Heaven can wait we're only watching the skies
Hoping for the best but expecting the worst
Are you going to drop the bomb or not?
Let us die young or let us live forever
We don't have the power but we never say never
Sitting in a sandpit, life is a short trip
The music's for the sad men
Can you imagine when this race is won
Turn our golden faces into the sun
Praising our leaders we're getting in tune
The music's played by the mad men
Forever young, I want to be forever young
Do you really want to live forever?
Forever, or never
Forever young, I want to be forever young
Do you really want to live forever?
Forever young
Some are like water, some are like the heat
Some are a melody and some are the beat
Sooner or later they all will be gone
Why don't they stay young
It's so hard to get old without a cause
I don't want to perish like a fading horse
Youth's like diamonds in the sun
And diamonds are forever
So many adventures couldn't happen today
So many songs we forgot to play
So many dreams swinging out of the blue
We let them come true
Forever young, I want to be forever young
Do you really want to live forever?
Forever, or never
Forever young, I want to be forever young
Do you really want to live forever?
Forever, or never
Forever young, I wanna be forever young
Do you really want to live forever?
A seguir ao filme da Angelina Jolie fomos ver outro filme. Eu e o meu amor. Não pagámos mais por isso porque ali no Corte Inglês (o Corte Inglês é ali), ali no Corte Inglês sais de uma sala e entras noutra e ninguém topa. É um segredo nosso. Era. Na outra sala estava a começar o filme do Sylvester Stallone. E o Stallone é um mercenário que se chama Barney Ross, e é amigo do Mickey Rourke que faz tatuagens e não sabe o nome das namoradas. E depois a certa altura há uma cena numa igreja: o Stallone a ser contratado pelo Bruce Willis para matar um general sul-americano. E o Bruce Willis diz que se chama Mr. Church e está vestido de padre. E de repente parecia que o Bruce Willis era o padre que ia casar o Stallone. O Stallone deixa de ser o Barney Ross e passa a ser um noivo. E só falta a noiva para o casamento se consumar. E não é que nisto entra o Schwarzenegger, o Arnold Schwarzenegger pela porta da igreja em conta-luz. E tu pensas: vão mesmo casar! O Arnold Shwarzenegger e o Sylvester Stallone! E o Bruce Willis é o padre!
Só que eles não vão casar. E não vão casar, primeiro porque estão a decidir quem é que vai à América do Sul matar um general mau. E segundo porque os casamentos entre pessoas do mesmo sexo não são permitidos em igrejas, e além disso Bruce Willis não é o Mr. Church, e porque apesar daquilo ser mesmo uma igreja, o Bruce Willis não é padre nem nunca pode ser porque o Bruce Willis é o Bruce Willis que não é o Bruce Willis, tal como o Stallone é o Barney Ross e não é uma noiva, mas também não é o Barney Ross, é o Stallone que não é o Stallone que é o Stallone que não é o Stallone e o Schwarzenegger chama-se Trench e não é o noivo e é o governador da California e é também o Schwarzenegger que não é o Schwarzenegger e de certeza absoluta que se o Bruce Willis perguntasse ao Schwarzenegger se ele aceitava o Stallone “to be your lawful wedded husband” ele dizia que não e tenho a certeza de que a Angelina Jolie respondia o mesmo até porque a Angelina Jolie não tem lugar neste filme porque esta não é a história da Angelina Jolie.
E é nisto que eu penso todos os dias quando acordo: “Porque é que andamos tão preocupados com a identidade do que quer que seja?”